segunda-feira, 28 de setembro de 2009

E o vencedor é...

...a democracia portuguesa. Pelo menos esta é a minha esperança. Lá chegaremos, mas antes olhemos para os partidos: o CDS é o grande vencedor destas eleições; o BE e sobretudo o PSD os derrotados.

Porque penso que o Bloco teve um desempenho negativo nestas eleições? Porque não concretizou o seu potencial. Existia uma grande dinâmica em torno do BE porque a esquerda descontente via no Bloco uma alternativa viável ao PS. Além disso, muitos eleitores "independentes" viam no Bloco uma oposição útil. O potencial no inicio da campanha era enorme e a possibilidade/expectativa de triplicar o número de deputados fazia todo o sentido. Acima de tudo, a possibilidade de governar com o PS ou então condicionar o futuro governo era uma realidade perfeitamente ao alcance.

O problema é que, com o decorrer da campanha, o BE foi desmascarado, digamos assim, e a sua imagem foi sendo colada à extrema esquerda. A sua ideologia tornou-se mais próxima da do PCP aos olhos do eleitor independente, o que fez com que muitos destes optassem por um voto útil diferente (CDS). O momento fulcral é aquele em que grande parte do eleitorado tomou consciência de que o BE poderia formar governo com o PS (algo de que tentaram desmarcar-se, com pouco sucesso) ou pelo menos ter força suficiente para, sozinhos, condicionarem um futuro governo. Isso criou algum receio em parte do eleitorado que via no BE um voto útil, que passou a procurar opções de voto mais "seguras".

O Bloco de Esquerda duplicou o número de deputados, o que é de louvar. Mas eu vejo o BE como um dos derrotados porque não soube aproveitar uma conjectura claramente favorável para chegar ainda mais longe. Ainda assim, os meus parabéns ao Dr. Louça por atingir um marco histórico na (ainda curta) história do Bloco de Esquerda e também da política nacional.

Quanto ao PSD, obteve uma derrota que, no mínimo, é estrondosa. É a consequência de dois aspectos cruciais: a péssima campanha eleitoral e, na sua base, de uma desunião dentro do partido. Este resultado é muito mais do que o quarto pior resultado do PSD desde 1976, muito mais do que apenas 0,32% melhor do que Pedro Santana Lopes em 2005: é tudo isso numas eleições frente ao primeiro-ministro mais contestado, mais desgastado e mais envolvido em polémicas (provavelmente) desde Salazar.

Esta derrota é a derrota da campanha isenta de compromissos levada a cabo pelo PSD. O único compromisso com os portugueses assumido pelo PSD foi o de retirar Sócrates do poder. Como ficou demonstrado, isso não basta para convencer os eleitores. Não basta dizer que o que lá está é mau, é preciso mostrar como se pode ser melhor. A aposta no tema da asfixia democrática saiu cara, como esperava. Foi um erro estratégico, sobretudo porque colocaram Sócrates numa posição em que ele se sente como peixe na água.

Eu sou optimista por natureza e, por isso, quero ver esta derrota do PSD como a derrota da "oposição do contra" e do "bota-abaixismo". Talvez esteja a ver castelos na nuvens, mas deixem-me apreciá-los enquanto o vento não os empurra daqui para fora.

Paulo Portas e o CDS foram o contraste (pelo menos à direita) de Manuela Ferreira Leite e da campanha do PSD: comprometeram-se com os portugueses ao apresentar propostas concretas, fugiram aos ataques pessoais e focaram-se em temas que realmente interessam a uma grande fatia do eleitorado. Resultado: passaram a barreira dos 10%, passaram a ser a 3ª força politica no parlamento e, mais importante, tornaram-se o partido (excluindo o PSD) que pode viabilizar sozinho um governo com o PS.

Portas foi o destaque positivo ao longo de toda a campanha eleitoral. Embora não seja apreciador do seu estilo, Paulo Portas mostrou ser um grande líder partidário. Os meus parabéns ao CDS pois, para além da vitória, obtiveram-na recorrendo a "politica de verdade".

Já o PCP (ou melhor, a CDU) teve um resultado "neutro". Embora tenha subido um pouco, passou para 5ª força no parlamento. É um sinal da necessidade de renovação no PCP. Mas também um sinal da estabilidade do seu eleitorado.

A análise aos resultados obtidos pelo PS e, em particular, por José Sócrates é difícil. Por um lado, o PS desce cerca de 9%, o que comprova o enorme desgaste da imagem de José Sócrates. Com esta queda, é difícil para mim concordar com o Primeiro Ministro quando enaltece a vitória obtida nestas eleições. Uma queda de 9% dificilmente pode ser vista como uma vitória, mesmo quando ainda assim é o partido mais votado e é reeleito como Primeiro Ministro.

Por outro lado, convém relembrar as batalhas travadas por este governo contra diversas classes. Professores, administração pública, magistrados, sindicatos, etc. O governo travou muitas destas batalhas mantendo-se fiel à sua visão (certa ou errada) o que levou a grande contestação e, consequentemente, grande desgaste. Ora, o facto de ainda assim terem sido reeleitos deve ser também lido à luz destas batalhas. Estarão os portugueses a dormir, como perguntava um homem hoje ao café? Ou concordarão os portugueses com o governo em todas as reformas, pois visam em geral classes consideradas privilegiadas? Ou estarão 36,56% dos eleitores, mesmo discordando de várias reformas impostas por este governo, a dar um voto de confiança a um executivo que se manteve fiel às suas ideias e levou as suas reformas avante, apesar de toda a contestação e as óbvias consequências para as eleições?

Assim, penso que é também difícil olhar para o resultado obtido como uma derrota clara para o PS. Talvez a melhor forma de descrever este resultado do PS seja um voto de confiança, mas com uma advertência muito forte. Sobretudo um alerta para a necessidade de diálogo.

É exactamente na necessidade de diálogo que reside a minha esperança, a esperança da democracia ter sido a grande vencedora destas eleições (apesar dos valores da abstenção, alarmantes para umas eleições tão importantes e num momento tão delicado). Os portugueses ditaram uma maior equilíbrio de forças no parlamento, o que levará obrigatoriamente a um maior diálogo entre os partidos. No pior dos casos (do ponto de vista do diálogo), mesmo que o PS e o CDS formem um governo de maioria absoluta, isso implicará um compromisso entre estes dois partidos que, em vários temas, têm posições opostas. Caso essa coligação não ocorra, o PS terá de obter acordos com diferentes partidos, devolvendo assim ao parlamento a sua principal função: discussão politica. E essa discussão terá de ser civilizada, pois nenhum partido está em posição de bloquear sozinho o governo. Até entre a oposição terá de haver diálogo.

Há quem preveja um período de grande instabilidade e novas eleições dentro de um ou dois anos. Como disse, sou optimista. E vejo nestes resultados uma excelente oportunidade de se elevar a qualidade da politica em Portugal. Pois ser governo agora exige cooperação. Pois ser oposição agora requer muito mais do que ser "do contra".

Este é o momento para ver até que ponto a classe politica é capaz de abandonar os seus odiozinhos e lutar, junta, por um Portugal mais forte.

4 comentários:

  1. Nem sempre tenho tempo para ler o teu blog, mas acho este post muito, mas muito, acertivo ! :)

    E logo eu que, como tu, considero-me sempre um optimista com muito gosto em ver "castelos nas nuvens" ! ;)

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  2. Nesta questão dos vencedores, é sempre interessante ver como no dia os vários contendedores puxam pelas mais diversas mais-valias para clamar vitória.

    Objectivamente, ganha quem obtém capacidade de intervenção no parlamento e no governo. E, nessa óptica, apenas dois partidos ganharam essa capacidade: o PS e o CDS-PP. O BE não tem qualquer poder negocial sem a CDU, e vice-versa, e o PPD/PSD não estará, nos tempos mais próximos, disponível para se entender com o PS.

    Foi um exercício de teatro o discurso de vitória do Francisco Louçã. Teve quase os mesmos votos ue o CDS-PP mas menos 5 deputados (menos 1/4 dos deputados do CDS-PP). Teve muito mais votos que a CDU mas no final acabou só com mais um deputado (16-15). E ficou sem qualquer peso negocial autónomo. Tudo somado, onde está a vitória onde? Sim, tiveram uma vitória moral, mas não passou disso.

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  3. Mas já é tradição em Portugal celebrarem-se vitórias morais :-)

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  4. Partilho completamente da tua visão Rui.

    PS: O que gostava de assistir era a um governo de 4 anos que não precisasse de coligação. E mesmo que esta existe, alguém se arrisca a uma resposta quanto à realização dos grandes projectos TGV e um novo aeroporto (sabe-se lá onde)?

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