terça-feira, 30 de junho de 2009

Portugal inviável

Sou engenheiro, não sou economista nem político. E, como engenheiro, procuro resolver problemas. E há um problema que anda já há algum tempo “in the back of my brain”, como diria e Laurie Anderson, para o qual não vejo ninguém apresentar nenhuma solução e que é o seguinte: como é que Portugal pode atrair investimento estrangeiro que fomente o crescimento económico e a exportação se aquilo que temos para oferecer de melhor para os investidores, comparativamente com outros países, é apenas bom tempo? Ou seja, que respostas tem a seguinte pergunta: “O que é que temos de oferecer de melhor do que outros para atrair o investimento externo que eles atraem?”.

Bom, e a resposta, infelizmente, é nada. Nicles. Se viram a excelente entrevista que Medina Carreira deu ao Mário Crespo na Sic Notícias de sexta última, ele no fundo disse o mesmo, o que me deixou tristemente convencido de que (eu) tinha razão para pensar como pensava. Pior, não só não temos nada a oferecer de melhor, como ninguém diz (ou sabe) o que podemos alterar para oferecer algo de melhor. Fala-se muito de excelência nos dias de hoje, e no fomento da excelência, mas a continuar assim essa excelência irá procurar outras paragens mais interessantes.

Uma dos tópicos focados por Medina Carreira para indicar a falta de atractividade de Portugal é a nossa justiça, que é fundamentalmente inoperante. Na minha opinião, Portugal é um país sem lei, muito embora tenha muitas (e más) leis, porque a justiça não é aplicada de todo ou não é aplicada em tempo útil. Nos Estados Unidos o caso Madoff já está encerrado e com uma condenação exemplar. Em Portugal, os casos BCP, BPN, BPP ainda estão em parte incerta e, provavelmente, irá tudo acabar em absolvições por prescrição, falta de prova ou erro processual ou em penas suspensas. Que empresa quer ir para um país onde, em caso de contencioso, mais vale não recorrer à justiça, porque apenas servirá para perder tempo, paciência e dinheiro? Já que é um hábito recorrente procurar modelos de excelência no estrangeiro (Irlanda, Finlândia, Dinamarca, etc.) para as mais variadas coisas, os nossos políticos poderiam importar o modelo de justiça anglo-saxónico como modelo de excelência para ter uma justiça eficaz. Isso não seria uma revolução, seria uma refundação de Portugal !

OK, vou continuar a ouvir o “Imagine” do John Lenon.

6 comentários:

  1. Não sou economista nem político, mas parece-me desnecessário o fatalismo do título. O que Portugal tem para oferecer pode não ser muito (embora, o "bom tempo" possa de facto contribuir dado o enorme potencial do nosso país para a exploração de energias renováveis), mas a solução não é um decreto de inviabilização... Precisamos de um Portugal motivado, na busca activa de soluções - e isso, idealmente, cabe a cada um dos seus cidadãos.

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  2. Penso que Portugal tem ainda algo a oferecer, mas por pouco tempo, que é a qualidade de formação de alguns cursos superiores e que é reconhecida internacionalmente. Infelizmente, essa qualidade está a diminuir porque os alunos estão a sofrer as consequências do facilitismo no ensino que foi implementado em Portugal mas também em muitos outros países. Assim, quando entram na universidade, vêm mal preparados e motivados, o que afecta a qualidade da sua formação universitária.
    O facilitismo é produzido por uma filosofia de políticas de ensino que têm como objectivo último, atingir as metas internacionais de entidades como a União Europeia ou a OCDE. Infelizmente, quase todos os países são escravos das estatísticas e, como qualquer engenheiro sabe, as estatísticas não reflectem a realidade, apenas reflectem a agenda política de quem as propõe.
    Para além disso, existe o efeito do observador (princípio de Heisenberg) nas estatísticas, ou seja, as políticas são desenhadas para gerarem boas estatísticas em vez de serem desenhadas para gerarem bons resultados.

    A justiça é um problema grave, mas também é um problema ainda mais grave a questão fiscal. Portugal é considerado um país pouco competitivo para as grandes empresas porque o código fiscal é muito pouco transparente e as pequenas empresas quase não pagam impostos por conseguirem "voar debaixo do radar" fiscal. Essa falta de competitividade significa que a economia de escala não funciona em Portugal porque existe um incentivo fiscal em limitar o tamanho da empresa.

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  3. A Justiça em Portugal funciona mal, por diversas razões. Temos algumas leis más mas outras muito boas! O problema não é a lei, ao contráio do que pensam os politicos que se divertem a mudá-la a toda a hora na esperança de que, como por milagre, a lei nova, só por si, faça o sistema funcionar melhor. O problema é a aplicação que se faz de lei (ou a falta dela); o problema é os tribunais estarem sobrecarregados de processos e haver falta de funcionários e juízes para os despachar. O problema é ainda se gravarem as audiências em cassetes audio e muitas vezes não se perceber o que está gravado e ter que se repetir julgamentos... O problema está no funcionamento de todo o sistema judiciário. Agora, em termos de lei e de principios processuais o nosso sitema é incomparavelmente melhor e mais justo que o anglo-americano. A falta de eficiente é que desacredita a Justiça e cria a ideia de que o nosso sitema é o pior de todos...

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  4. Jorge,

    "Precisamos de um Portugal motivado, na busca activa de soluções - e isso, idealmente, cabe a cada um dos seus cidadãos."

    Nem mais. Aliás, alguns dos meus últimos posts vêem nesse sentido. Cabe a todos nós, mas a classe politica tem uma responsabilidade superior, pelo seu mediatismo. Somos um país onde reina a critica destrutiva, e a critica construtiva é vista como um sinal de fraqueza. Mudar essa mentalidade levará o seu tempo, mas chegará.

    Fausto, infelizmente o ensino é apenas um entre milhares de exemplos do principio de Heisenberg. Há muito que esse paradigma se instalou (no mundo ocidental).

    Em relação à Justiça, essa bela e complexa dama, estou totalmente de acordo com a Nina: é um problema "logístico", não de base.

    Eu cá percebo-te, André. Justiça é apenas um exemplo, o que o Fausto refere outro. Neste momento, sim, Portugal é muito pouco "atraente" para o investimento estrangeiro.

    Mas não por falta de potencial. Isso é crucial frisar! O problema é toda a camada de burocracia, idiocracia e estupidez legislativa que cobre esse potencial. Pior: que obriga esse potencial a emigrar.

    E acabo citando o Jorge de novo: "Precisamos de um Portugal motivado, na busca activa de soluções". Porque potencial existe.

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  5. Portugal não é inviável!
    Falta-lhe é uma orientação e pessoas que o saibam conduzir para a viabilidade.

    Na semana passada vi um projecto fantástico numa das freguesias do Porto chamado HUB. A ideia é juntar no mesmo espaço pessoas com ideias e investidores. Assim criam-se sinergias muito importantes para o desenvolvimento de cada freguesia e do país.

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  6. Eu não disse que não temos potencial, a questão é que ele não consegue emergir porque o "sistema" dificilmente o permite. Notem, o meu artigo referia-se à nossa capacidade de atracção de investimento, não à nossa mediocridade enquanto pessoas e profissionais.

    Quanto ao sistema de justiça, é uma falácia dizer que é melhor que o anglo-saxónico mas que não funciona por falta de meios e pessoas. Ele funciona de forma diferente, é tudo. E essa forma faz com que não funcione. E como não funcina, não presta. Por muito boa que teoricamente possa ser. Porque, como qualquer engenheiro sabe, o óptimo é inimigo do bom.

    Só para apontar uma pequena (grande) diferença: os Procuradores, nos Estados Unidos, são eleitos, respondem perante os eleitores, que os suportam com os seus impostos, logo dependem dos eleitores. Podem ter políticas eleitoralistas? Sim, podem. Mas os presidentes, os governos e os parlamentos também, e não é por isso que deixam de ser eleitos.

    Cá, é uma bagunça. Os Procuradores são escolhidos de uma forma difusa e por múltiplas entidades, poderes, comissões, conselhos, logo não respondem perante ninguém, o seu plano de acção (as suas prioridades) é traçada não se sabe bem por quem (mas não pode ser o governo, por causa da separação de poderes), enfim, as meias-tintas típicas dos sistemas que não se pretende que funcionem.

    Termino, com humor, com uma frase do RAP, na Boca do Inferno da Visão desta semana: "O sistema de justiça americano, tantas vezes apontado como exemplo, acaba por não ser muito diferente do nosso: Madoff foi condenado a 150 anos; em Portugal, o julgamento duraria 150 anos. As semelhanças são óbvias".

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