Depois de uma longa ausência da blogosfera, tinha planeado voltar com algumas postagens durante estas (curtas) férias. Tinha vários temas em mente. Talvez demasiados, porque acabei por me sentir perdido no meio de tanto caos. Aí, decidi fazer um exercício um pouco mais generalista. Procurei entender o quanto mudei desde que comecei este blog e a que visão do estado e da politica portuguesa essa mudança me levou.
Hoje, sinto-me mais liberal, sobretudo no que toca à economia. Não anarquista. Acredito que a longo prazo, o mercado trata de equilibrar a riqueza de uma forma justa. Mas apenas se o mercado for verdadeiramente livre. Um contra-exemplo usualmente atirado contra o liberalismo (sobretudo o norte-americano) é a recente crise financeira. Não posso deixar de discordar, visto que a grande alavanca que levou a este crash foi toda a problemática com o sub-prime, que foi criada através de uma intervenção estatal no mercado imobiliário. Portanto, esta crise, embora tenha surgido num mercado tradicionalmente liberal, veio de uma medida que de liberal tem muito pouco.
Acredito que se o mercado funcionar de forma verdadeiramente livre, acabará sempre por convergir para um equilíbrio justo. Quando se desvirtuam as regras de mercado, este responde... desregulando-se. Criam-se desequilíbrios, muitas vezes camuflados como equilíbrios sociais, atingidos à custa de uma brilhante intervenção estatal. Esses equilíbrios, que de equilibrados têm muito pouco, são temporários. E quando o seu prazo de validade expira, mostra a sua verdadeira cara de desequilíbrios, com a balança sempre a favorecer os já favorecidos.
Vejamos o caso do (des)emprego. O paradigma em Portugal, após a revolução, foi (é?) de uma defesa acérrima dos direitos dos trabalhadores (falar em direito dos empregadores é tabu no nosso país). Tomaram-se assim várias medidas de proteccionismo cerrado ao emprego. Salutar, dirão muitos. Justo para os trabalhadores, gritaram imensos.
Será mesmo? Essas medidas levaram-nos a menos desemprego? Não me parece. Levaram a mais justiça social, nomeadamente na distribuição da riqueza? Não, um redondo não. Intervenção do Estado no mercado, com medidas que visam favorecer os trabalhadores na sua relação com o empregador. O resultado? Está à vista: a balança inclinou-se mais uma vez para o grande capital. O trabalhador acaba como vitima de inúmeras formas. Uma das mais curiosas que me lembro é quando um trabalhador decide passar a empregador, e aí acaba por ter as asas cortadas, porque o voo implica pagar um valor insuportável para direitos dos trabalhadores. "Trabalhadores" esses que não chegam a existir, porque os seus direitos são caros.
Depois temos os apoios do Estado a empresas. A certas empresas, convém acrescentar. Isso viola uma das leis básicas do mercado: igualdade. Quando certos intervenientes no jogo têm regras especiais, é natural que o terreno de jogo fique inclinado. E quem paga essa inclinação são os consumidores, no final de contas. Temos ainda a ineficiência do Estado no pagamento das suas dívidas, na devolução do IVA, entre outras, que leva a que empresas com dificuldades tentem sobreviver em vez de tentar crescer, enquanto o grande capital tem margem de manobra para continuar a implementar o seu domínio. Acrescentando ainda a lentidão na justiça, não é nada surpreendente o estado actual da nossa economia.
Uma outra forma de intervenção estatal está no IVA. 20% não é muito; é demais. Estamos a falar de diminuir em 1/5 o poder de compra dos consumidores, o que naturalmente tem um impacto brutal no mercado. A justificação para este imposto é nobre: suportar os custos de ter um Estado. Os custos da democracia.
Idealizo o Estado como uma entidade vigilante e reguladora, apenas intervindo directamente numa área que dificilmente será privatizável: a Justiça. Acrescentaria talvez a Saúde. Temos ainda a vertente de apoio social, embora tenha algumas dúvidas sobre a eficiência de um sistema de apoio social centralizado e pesado.
É na necessidade de um sistema judicial justo que reside a razão de ser de um Estado. É esta necessidade que justifica que cada um de nós contribua com um pouco do seu trabalho para suportar os custos de um Estado. E é aí que chego a sentir uma certa revolta. Pois se o Estado falha redondamente na sua principal função, qual a justificação para os 20% de IVA?