sexta-feira, 2 de julho de 2010

The golden (share) rule

Diz o ditado “Golden Rule: He Who Has the Gold Makes the Rules”. Isto é mercado puro, que não existe em lado algum. Muito embora, sob o pano, debaixo da mesa, não deixe de ser verdade.

No início do Séc. XX, o modelo de mercado puro, ou perto disso, deu provas da sua fragilidade com a Grande Depressão no final dos anos 20. Uma lição que se tirou daí foi que os Estados não podiam deixar “cair” o mercado, sob pena de terem de “reconstruir” as economias locais. Foi o que aconteceu nesta depressão actual. Porém, há um lado perverso neste paradigma, e que se demonstrou na mais recente crise: se um prevaricador tiver uma dimensão significativa, ele não vai ser deixado desprotegido. Isto significa que há um benefício do infractor, e esse será tanto mais garantido quanto maior for o peso do infractor na sociedade. Dir-se-ia que onde se pedia responsabilidade, dá-se subsídio. E aproxima-se de um modelo muito normal entre nós, Portugueses, que se pode resumir a “benefício privados, prejuízos públicos”.

Dizem os gurus do mercado que o Estado Português não deixou que o mercado funcionasse no caso da PT. Errado, o mercado funcionou. Acontece que um dos intervenientes, por acaso o que tem direito de veto, não achou que o encaixe financeiro justificava a perda de competitividade internacional de uma empresa com elevado potencial empregador de know-out qualificado, com uma forte ligação à investigação neste país e com grande potencial exportador de soluções de cariz tecnológico. Isto é mercado, simplesmente quem avaliou os prós-e-contras da venda foi uma entidade, um Estado, um governo, que não se preocupa apenas com lucros mas que se tem de preocupar com pessoas e com o futuro delas. É claro que os fundos financeiros não pensam desta forma, mas o estado Português não tem de se preocupar com os mesmos. E se não estão satisfeitos, podem já começar a vender a sua participação na PT.

Dizem os gurus do mercado que o Estado Português quebrou as regras do jogo. Acho curioso o emprego desta palavra, jogo, porque para esses gurus tudo isto não passa de uma espécie de brincadeira, como se não estivesse envolvido nestas compras e vendas o futuro de muitas pessoas. Danos colaterais, dirão outros gurus. Adiante. Mas o Estado não quebrou as regras de jogo algum, a golden share sempre existiu, não foi criada de propósito para esta situação. Quem tem acções da PT sempre soube que existia uma espada de Dâmocles, chamada golden share, sobre o poder dessas acções. Acabar agora com a golden share é que é alterar as regras do jogo.

O BES, o membro mais forte do núcleo duro que controla a PT, fez a sua escolha estratégica e mostrou que, claramente, não se importa de hipotecar o capital inovador de Portugal e o peso estratégico da PT para resolver alguns problemas internos de liquidez. Pois bem, se alguma tiver que desaparecer, antes o BES que a PT. Porque com amigos destes, venham os inimigos.

3 comentários:

  1. André, mais uma vez, os meus parabéns por mais este artigo!

    A Golden Share do Estado na PT já existe há muito tempo e foi criada com o intuito de não permitir que o poder de decisão na Empresa se afastasse do nosso país.
    Então e agora que foi finalmente usada critica-se?
    A decisão de vender ou não a Vivo era muito importante para a PT, pois esta significa 45% das receitas, 40% dos lucros, 80% dos clientes da PT. (um àparte como é que 80% dos clientes rende apenas 40% dos lucros? Isso quer dizer que os outros 20% fazem render 60%. Conclusão: Estamos a pagar muito pelas nossas chamadas!)

    Se a Vivo for vendida, então a PT fica sem a sua galinha dos ovos de ouro e caminhará facilmente para o abismo! Será que os accionistas da PT defenderam a empresa naquela reunião de accionistas? Ou defenderam somente os seus interesses?
    Temos que combater esta ideia que está a instalar-se na nossa sociedade de que os lucros são privados e de que os prejuízos são públicos!

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  2. Uma vez mais, obrigado Betxu!

    Quando à disparidade clientes vs. lucros, posso adiantar duas hipóteses (que não são mesmo mais do que isso): mais clientes empresariais em Portugal, que rendem mais, e menor custo de vida no Brasil , que pode justificar tarifários mais económicos, com menores margens, no Brasil.

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  3. Comecei por escrever um comentário, mas acabou num novo post :D

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