Cavaco Silva, num instante fugaz de verdade, a tal que ele tanto apregoa, ou então de atroz senilidade, deixou escapar que os Portugueses devem abdicar de uma segunda volta, e resolver tudo à primeira, porque isso teria custos para o país, nomeadamente ao nível das taxas de juro. Esta afirmação, que foi bastante ignorada pelos jornalistas e pelos opinion makers do costume, é grave, muito grave, para além de indemonstrável.
É grave porque ela mostra quanto a personagem valoriza a economia face à democracia. Cada qual tem a sua escala de valores e ele tem a sua, muito embora faça um esforço enorme por a não revelar. Acontece que não é a minha. E se já não gostava nada do estilo presunçoso e vazio, recheado de lugares-comuns óbvios ou de conclusões indemonstráveis como esta, agora ainda gosto menos porque revela que, se for chamado a escolher entre democracia e economia, o campo dele não é o meu, a escolha dele não é a que me interessa, no fundo, que os valores democráticos dele não são os meus. Sim, porque democracia significa, para quem já se esqueceu, governo do povo, e não governo da economia.
Coloca-se a questão: então se a segunda volta é penalizante, não o será também a primeira? Não será melhor deixar estar tudo como está, para os "mercados" ficarem felizes e nós com uma taxa de juro mais moderada? E, já agora, que tal suspender a democracia, como sugeriu a sua correligionária e colega de governo e de BdP, para colocar a casa em ordem?
Infelizmente, a nossa maior crise é essa mesmo: a crise de valores.
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