terça-feira, 20 de outubro de 2009

Mário David: Já chega!

Transcrevo aqui o texto da página oficial do eurodeputado Mário David (PSD), vice presidente do Partido Popular Europeu

José Saramago: Já chega!

José Saramago, há uns anos, fez a ameaça de renunciar à cidadania portuguesa. Na altura, pensei quão ignóbil era esta atitude. Hoje, peço-lhe que a concretize... E depressa! Tenho vergonha de o ter como compatriota! Ou julga que, a coberto da liberdade de expressão, se lhe aceitam todas as imbecilidades e impropérios?

Se a outorga do Prémio Nobel o deslumbrou, não lhe confere a autoridade para vilipendiar povos e confissões religiosas, valores que certamente desconhece mas que definem as pessoas de bom carácter.

Umas declarações dessas claramente só podem vir de uma pessoa com uma forte intolerância religiosa. A tolerância implica aceitar críticas, cartoons, outros pontos de vista e, mais que tudo, aceitar quem não acredita em Deus, Buda ou Thor.
Para quem acredita em Deus, devia considerar a atitude de Roger Williams, o fundador do estado de Rhode Island, EUA, que foi banido do Massachusetts pelas suas ideias radicais, tais como a separação entre a igreja e o estado, a liberdade religiosa e a vivência pacífica com os índios americanos. Apesar disso, era uma pessoa extremamente religiosa, pastor e fundador da primeira igreja baptista na América. Rhode Island tornou-se um refúgio para pessoas de todas as crenças e, para além disso, viviam lado a lado com os índios, aos quais tinha comprado a terra para criar a colónia de Rhode Island que, mais tarde, veio dar origem ao estado homónimo.

Uma pessoa que demonstra através das suas acções ser de bom carácter, só o é verdadeiramente se não esperar nenhuma recompensa ou castigo pelas acções que realiza.

14 comentários:

  1. É-me difícil comentar tamanha patetice proferida por esse nosso eurodeputado. Mostra, claramente, que entre ele e aqueles que se levantaram em peso contra as caricaturas de Maomé não há qualquer diferença. Que entre ele e os que lançaram a perseguição a Salman Rushdie há evidentes ideias comuns.

    A liberdade de expressão foi uma conquista fundamental das sociedades modernas tolerantes, e que as fez mais fortes para poderem evoluir. Esse senhor, claramente, ainda está na Idade Média, e deverá decerto ser um apreciador do estilo Manuelino de intolerância religiosa.

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  2. Não concordo em nada com esse nosso representante europeu mas não concordo, também, que se possa achar natural que uma qualquer pessoa diga o que quer sem sofrer consequências sobre o proferido. Acho que, em toda esta discussão, se está a confundir liberdade de expressão com libertinagem verbal, que são coisas, a meu ver, bastante diferentes.

    Da mesma forma que eu não posso ofender pessoalmente qualquer pessoa sob pena de me ser imposto um processo judicial também não acho natural e proveitoso não se poder criticar alguém que, à sombra de um qualquer estatuto cultural, profere obscenidades e ofensas sobre uma determinada religião.

    Acho que o mal em toda esta questão é o extremismo existente em algumas posições que leva a reacções ainda mais extremistas.

    Mais uma vez, à boa maneira portuguesa, falta bom senso na análise à questão e uma dose de "cagança" também extrema no "nosso" (e coloco entre aspas com uma dose de tristeza) vencedor do Prémio Nobel que, por ser inconscientemente um exemplo para a nossa sociedade, devia ter um cuidado especial sobre as suas acções.

    Lanço, também, uma outra questão que me parece bem mais pertinente: grande jogada de marketing, não foi?

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  3. Tal como a liberdade de expressão deve ser respeitada em relação às palavras de Saramago, também ela deve ser respeitada em relação à opinião de Mário David sobre Saramago.

    Em causa não está a tolerância religiosa, está o ego de duas pessoas que não conseguem ver a "big picture" (tanto Saramago como o deputado europeu, e provavelmente a maior parte de nós).

    E já agora, normalmente as pessoas que compreendem a religião são tolerantes, porque todas as religiões se baseiam em principios universais de bondade (uns focando mais a sociedade, outros o individuo, mas globalmente o resultado é o mesmo). Ou seja, na minha visao das religioes o extremismo não tem lugar. Esse é apenas reservado a um subconjunto de pessoas q na realidade nada têm a ver com a religião em si.

    Quanto a Saramago considero-o um dos melhores escritores portugueses. Contudo não partilho nem de perto a sua visão sobre a igreja católica.
    Quanto ao Sr. deputado os comentários infelizes são já marca da classe política, por isso não os estranho e aceito-os de forma natural.

    Resumindo coisas de quem não tem nada que fazer....

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  4. Jogada de marketing? Não sei ... tenho muitas dúvidas.

    Na realidade, as afirmações de Saramago não podem ser rebatidas pela grande maioria das pessoas, mesmo que sejam católicos, porque nunca leram a Bíblia (assumindo, claro, que Saramago leu e que, por isso, fala do que sabe). Portanto, a sua reacção será extrapolada da reacção de outros, e aqui temos um ponto relevante. Se a maioria dos potenciais leitores se revirem mais nas posições tradicionais da Igreja, então a jogada poderá não ser muito vantajosa.

    Pessoalmente, acho a questão uma patetice pegada. Eu gosto do Saramago pelo que escreve, e muito especialmente pela maneira como escreve, e as suas ideias políticas e religiosas não me dizem respeito nem me sinto obrigado a prestar-lhes atenção (e discordo frontalmente de muitas delas). Também acho que desde o "Ensaio sobre a cegueira" que as suas obras têm manifestado um declínio acentuado, com particular evidência na última antes desta, "A viagem do elefante", que não tem "chama". Longe vão os tempos d' "A história do cerco de Lisboa", o seu melhor, para mim. E isso é que me faz ter muitas dúvidas se vou ler mais este volume, não o tema nem a polémica.

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  5. Eh! Que discussão interessante que para aqui vai! Não pela sua origem, mas pelas temáticas que aqui já foram faladas.

    Parece-me que há dois pontos importantes que quase nada têm a ver com as declarações do Saramago, porque católicos e ateus sabem que o que Saramago disse não é nenhuma mentira!
    A biblia tem muitos textos que possibilitam uma boa educação, por exemplo algumas parábolas. Mas tem também muitos textos que possibilitam uma péssima educação... não são raras as referências a homicídios, chacinas, vingança,... de que é exemplo o episódio do personagem biblico Caim que também dá nome ao livro do Saramago!
    Não sei qual o escândalo das palavras do Nobel? A Bíblia (também) é um manual de maus costumes ou pensam que toda a gente que lê a biblia deu em Madre Teresa de Calcutá? Muitos houve, ao longo da história, que mataram em nome do que leram na Biblia. E se a Biblia fosse um livro perfeito então ela seria lida na íntegra nas missas e tal não acontece!
    E no que concerne a declarações, as da Igreja Católica foram muito mais pecadoras que as do Saramago... O homem não ofendeu ninguém directamente, mas foi apelidado de ignorante!

    Nisto quem me deu a melhor lição foi um padre com os seus 90 anos! Ele disse-me que a Biblia era um livro poético e que não pode ser levado à letra. E deu-me o exemplo dos portugueses... Nós acreditamos que nos sécs XV e XVI fomos um grande povo e para mostrar isso podemos ler os Lusíadas. Mas lá porque lemos esse livro maravilhoso do Camões, quer dizer que acreditamos que os navegadores fizeram uma orgia com as Ninfas? Ou que acreditamos que só chegámos à Índia porque os Deuses nos deixaram?

    Agora sim, os pontos importantes da discussão e que foram lançados pelo Ricardo: as diferenças entre liberdade de expressão e libertinagem verbal, parecem conceitos semelhantes, mas são completamente opostos no fundamento e nos resultados e estão constantemente a serem confundidos! Considero urgente que a jovem democracia portuguesa os discuta de forma aberta na sociedade.
    O outro ponto é o (suposto) interesse comercial nas declarações do Saramago. Será que numa sociedade livre se podem usar todos os meios para divulgar ou fazer publicidade? Ou será a imposição de regras uma quebra dessa mesma liberdade? Será o mercado (neste caso, nós leitores) o único e melhor regulador da publicidade?

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  6. Começando pelo final do comentário do Beto, eu penso que sim: o mercado é o melhor regulador. Com os passar dos anos estou a tornar-me um liberal :-)

    Bem, a verdade é que em nome da liberdade de expressão se cometem ataques à integridade pessoal de cada um (como tanto discutimos no tema Manuela Moura Guedes), quebrando-se assim a barreira entre a liberdade da imprensa e o direito a julgamento justo e imparcial de cada individuo. Num mercado totalmente liberalizado, este problema não se colocaria,pois o próprio mercado daria pouca relevância à situação. Mas isso implica que, para além de liberal, o mercado seja evoluído e consciente. O que, sejamos realistas, não acontece para já. Mas ainda assim sinto-me caminhando para o liberalismo... São fases :-)

    Ora, para atacar o problema, vejo dois pontos fundamentais:

    1. Liberalizar por completo a imprensa
    2. Punir (severamente?) os que, em nome da liberdade de imprensa, mentem ou omitem parcialmente a verdade e passam a barreira da isenção, atingindo a integridade de cada individuo.

    Quanto ao tema Saramago vs Mário David, eu faço o meu papel de agente integrante do mercado: estou-me marimbando. Saramago disse o que pensa, óptimo. Sendo vencedor de um Nobel, a sua posição requer responsabilidade e tem bastante impacto. Talvez devesse conter-se um pouco, sim. Mas vá, é um excêntrico, é o seu estilo. E o seu estilo vende. Logo há que alimentar o estilo. Quanto a Mário David, a junção do papel de eurodeputado ao de virgem ofendida não lhe ficam muito bem, é certo. Talvez tenha dado um sinal de intolerância. Tudo bem. Mas, tal como Saramago, disse o que pensava, óptimo.

    Mal estaremos é quando Saramago não poder expressar a sua excentricidade ou Mário David a sua intolerância. Até lá... marimbem-se para eles e leiam antes o Costa Rochosa :-)

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  7. Discordo do Saramago na quase totalidade dos seus posicionamentos mas isto não significa que eu seja favorável a negar-lhe o direito de expressar as suas opiniões.

    Só não concordo com o "double standard". A liberdade de expressão deve ser respeitada tanto para a opinião Saramago quanto para a opinião eurodeputado Mário David.

    Este double standard ocorre seguidamente na Europa. Qualquer um pode "bater" na Bíblia sem problemas. Quem resolve reagir é sempre o intolerante. Agora quem critica/questiona o Corão sempre comete o "gravíssimo crime" de intolerância, mesmo que a reação seja várias ordens de magnitude mais intolerante.

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  8. É exactamente esse o problema, Tiago. Existem duas opções extremas: ou tudo é controlado por entidade central reguladora ou então terá de haver um liberalismo total. No primeiro caso, a barreira entre controlo e censura é muito ténue, daí que eu não tenha especial paixão por esta hipótese.

    No segundo, quando falamos em liberalismo total, tem de ser mesmo total, no sentido do comentário do Tiago. Isto é, não podemos dizer que alguém veio atacar a liberdade de expressão por ter... falado, expressando a sua opinião.

    Olhando para o caso Manuela Moura Guedes vs José Sócrates, sou da opinião de que a Manuela pode fazer o jornalismo que bem entender (o mercado tratará de acertar o que é correcto ou errado), opinando da forma que entender, totalmente enviesada ou não. Trata-se de liberdade de expressão, de acordo.

    Mas da mesma forma que devemos exigir essa liberdade para a Manuelinha, devemos de respeitar o direito de resposta de José Sócrates. Devemos aceitar que este se revolte e expresse a sua revolta publicamente. Trata-se da liberdade de expressão de José Sócrates.

    É isto que me faz confusão: terem vindo atacar violentamente o Primeiro-Ministro por se ter pronunciado contra o jornalismo da Manuela, atacando a liberdade de expressão. Afinal, José Sócrates não tem essa liberdade também?

    E não me venham com a conversa de que um governante não pode ter essa liberdade da mesma forma que um jornalista tem, utilizando o argumento de que se trata de uma posição de poder. Convém não esquecer o enorme poder que a imprensa tem.

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  9. E aí entra tambémm, como dizias ontem, o efeito auto-regulador do mercado. Em ultimo caso, as consequências das palavras manifestam-se sempre: Sócrates não é levado a sério porque se coloca sempre no papel de vítima, Manuela Moura Guedes não é levada a sério porque sente a necessidade de atacar sempre que emite uma opinião.

    Haja liberdade, tolerância e inteligência, e o assunto da liberdade de expressão não precisa de ser abordado...

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  10. Eu acrescentaria a não existencia de extremismo. Este caso é um bom exemplo: quando se leva ao extremo a defesa da liberdade de expressão, acaba-se a censurar alguém...

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  11. Há aqui algo mais que a simples liberdade de expressão. Não creio mesmo ser isso que está em causa.

    Saramago criticou algo sobre a Bíblia, sobre o seu Deus. Está no seu direito e, notem, não criticou os Judeus e Cristãos por a seguirem. A sua opinião neste caso não me aquece nem me arrefece porque não sei, objectivamente, se tem ou não razão, nunca li (nem conto ler) a Bíblia.

    Mário David pode discordar da opinião de Saramago, está no seu direito, e pelos visto discorda. Mas quando diz que Saramago, por ter a opinião que expressou, não deveria ser Português, está a assumir (ou a sugerir) que todos os portugueses deveriam pensar como ele, Mário David, e não deveriam pensar nem dizer o que Saramago disse, porque isso não é de bom Português. E isto, sim, é na minha óptica criticável, porque já está a invadir a liberdade de pensamento e expressão dos outros Portugueses, que ele não tem o direito nem o dever de condicionar como devem pensar ou o que devem afirmar.

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  12. Rui, no teu último "apedrejamento" referiste a intersecção de liberdades. Houve uma expressão que aprendi quando miúdo que reflecte o meu modo de estar em sociedade e que, neste caso (não no caso específico do Prémio Nobel mas das "guerras verbais" entre religiões ou na crítica das mesmas), deveria sempre ser aplicada:

    "A minha liberdade acaba onde começa a do outro."

    Acho que é por terem - os dois interlocutores acima referidos - violado esta regra que a questão tomou proporções desmedidas e desnecessárias.

    Mais uma vez, ganham as duas figuras notoriedade por razões erradas mas, já dizia a grande filósofa social Lili Caneças, "mal ou bem, o que importa é aparecer"...

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  13. 1. A liberdade de expressão é um direito consagrado na nossa constituição e em muitas outras.

    2. O direito à defesa da honra julgo ser outro (não estou certo, mas penso que sim).

    3. É frequente estes dois direitos colidirem e, quando isso acontece não é fácil decidir qual deve ter prioridade (ver casos Sócrates vs. jornalistas).

    4. Não existe, que eu saiba, nenhum direito particularmente consagrado às religiões que impeça os cidadãos de as criticarem (às religiões, as pessoas que as praticam são um caso diferente)

    5. O Mário David protesta com as declarações que visam uma confissão religiosa (não uma pessoa) e, por muito que se sinta indignado com elas, julgo que não tinha o direito de usar do seu estatuto de representante da nação na Europa para o fazer.

    6. (Sim, ponho as pessoas acima das confissões religiosas no que a direitos diz respeito)

    7. Se as declarações de Saramago visassem uma qualquer religião oriental semi-desconhecida alguém se indignaria? As liberdades e direito em causam não seriam exactamente os mesmos? Então admitam que só se sentem incomodados por a religião católica vos diz alguma coisa mais do que nada.

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  14. Discordo em absoluto de Saramago em relaçao as afirmaçoes deste sore a biblia

    Apesar de nao ser catolico praticante e nao ter a mesma visao de deus que a igreja nos tenta revelar, penso que a biblia,assim como a religiao catolica, budista, etc. sao um excelente codigo de conduta...
    se vivessemos como eles citam seriamos mais felizas, no entanto, nao e possivel faze.lo na sociedade implantada hoje em dia... (ou quiça em qq sociedade humana)

    Mas, como já disseram, isso nao lhe tira o direito da liberdade de expressao

    Assim como o deputado tem o direito de expressar a sua indignaçao face as afirmaçoes de saramago-

    Cabe-nos a nos (ou deveria caber) e não a comunicação social defenir a importancia dada ao assunto...

    Reparem que ambos se limitaram adar a sua opiniao, nao houve grandes discussoes nem nada do genero...
    No entanto a falta de noticias briga-nos a noticiar fenomenos destes

    Estamos mesmo em portugal

    Fernando
    www.pensamentosdaciencia.blogspot.com

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