terça-feira, 25 de agosto de 2009

O sonho americano vs o sonho europeu

Em 2004, foi lançado um livro com o título The European Dream: How Europe's Vision of the Future Is Quietly Eclipsing the American Dream. O interessante é que este livro foi escrito por um autor americano, Jeremy Rifkin, que é um economista e foi consultor em várias presidencias da União Europeia.
A grande diferença entre os dois sonhos é que a versão americana, que é sobejamente conhecida, prima pelo individualismo radical e pelos direitos de propriedade. Isto é claramente reflectida na 2ª Emenda da constituição Americana e numa série de leis que têm origem no direito anglo-saxónico, em que a casa de cada homem é o seu castelo. Para além disso, vemos as questões dos direitos de autor e propriedade intelectual, que são muito mais protegidos e defendidos nos EUA que na Europa.
Por outro lado, o sonho europeu, que ainda é um work-in-progress, defende os direitos da comunidade, da sustentabilidade e dos direitos humanos. Esta visão pós-modernista de uma sociedade, que foi temperada por séculos de guerras e conflitos, é reflectida nas sociedades escandinavas, que tantas vezes são alvo de inveja por parte de países do sul da Europa.
O sonho americano é uma regra muito simples: se te esforçares e tiveres força de vontade, continuarás a ser pobre e não esperes nenhuma ajuda do estado caso tenhas um azar. Infelizmente, as excepções à regra são usadas para descrever o sonho americano. Uma estatística optimista seria uma taxa de sucesso 1:1000.
O sonho europeu é mais difícil de descrever porque não é definida pela perspectiva do indivíduo. Penso que uma boa descrição será: se todos os membros da comunidade tiverem boas condições de vida, acesso à educação e serviços de saúde de qualidade e garantias que protecção social em caso de um azar, então todos os membros da comunidade estarão melhor servidos. Claramente, implementar esta visão é extremamente difícil e penso que a chave é a mentalidade.
Em Portugal, o chico-esperto vive do (mísero) subsídio de desemprego enquanto vai fazendo uns biscates sem passar factura e queixa-se que só queria que a Câmara Municipal lhe desse uma casa. No entanto, conseguiu arranjar um carro importado da Alemanha e deu a volta ao sistema para não ter que pagar tantos impostos. Esses mesmos impostos de que tanto se queixa mas pouco paga.
Claramente, um país de chico-espertos não pode viver o sonho europeu, quando o único sonho que têm é ter um carro acima das suas possibilidades para poder contar aos amigos que deu 247km/h na A1.
O Richard Dawkins cunhou o termo meme para descrever uma unidade básica de ideias e conceitos que se espalham por uma sociedade, sofrendo as mesmas pressões evolutivas que o os genes. Tal como os genes, as estratégias evolutivamente estáveis (EEE) fixam-se numa população quanto nenhuma outra estratégia consegue invadir com sucesso essa população. No entanto, uma estratégia individualista dominante raramente consegue se invadida por uma estratégia solidária, mesmo que esta fosse benéfica para a população em geral.
Basicamente, os países escandinavos foram invadidos com sucesso por uma série de estratégias solidárias que se tornaram EEE, e por tal, uma minoria da população que seja apresente estratégias individualistas não conseguirá obter maiores benefícios e rapidamente esse meme será eliminado por selecção natural.
Por outro lado, Portugal tem como EEE a estratégia chico-espertismo, que muito difícilmente pode ser invadida por estratégias solidárias para que estas se tornem EEE.
A pergunta fica... Como é que se pode acabar com o chico-espertismo em Portugal?

2 comentários:

  1. É uma boa questão! O grande problema de Portugal é mesmo esse, toda a gente se queixa do país que temos mas quase todos contribuem para que assim seja! E é um ciclo vicioso - todos procuram fugir aos impostos, declarar o mínimo possível e tentar arrancar o máximo de dinheiro ao Estado (desde os que vivem do rendimento mínimo aos grandes gestores das empresas públicas e aos próprios governantes). Depois todos se queixam de que o país não evolui e que não têm o apoio que precisam do Estado. Claro que depois como nada funciona bem - maxime, saúde, justiça e educação - maior é a tentação de fugir aos impostos porque não sabemos para onde vai o nosso dinheiro, que tanto nos custa a ganhar! Mas se a chique-espertice acabasse e se todos contribuissem para o desenvolvimento do país então poderiamos todos viver melhor, sem dúvida!
    A este propósito lembro-me sempre de uma conversa a que tive com umas colegas no 1º ano da faculdade. Estavamos a falar das candidaturas aos SASUP, para receber bolsa de estudo e uma delas disse que não ía entregar os papéis porque não devia ter direito. Logo alguém lhe respondeu: Só se pedires é que sabes se tens ou não! Ao que ela retorquiu: "Seja como for eu não preciso, por isso não vou pedir, de certeza que há pessoas que precisam mais do que eu e se eu não pedir mais sobra para essas".
    Lembro-me de ficar estupefacta com a resposta e de ter admirado a colega por essa atitude! Se todos fossemos assim as pessoas que realmente precisam da ajuda do Estado teriam acesso a ela!

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  2. Muito bem argumentado
    Acho que o chico espertismo esta cada vez mais implantado, e que o segredo estaria em, de alguma forma, conseguir abrir os olhos aos portugueses...
    mas como abri-los
    Haverá clorocil suficiente nas farmacias portuguesas?
    Culmino com aquela que e para mim a frase mais celebre de churchile
    "nao perguntes o que a sociedade pode fazer por ti... Pergunta o que tu podes fazer pela sociedade"

    Fernando
    www.pensamentosdaciencia.blogspot.com

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